reportagem especial

Cidade da região não registra homicídios há pelo menos uma década

Pâmela Rubin Matge e Maurício Barbosa

data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Eduardo Ramos (Diário)

Você se lembra quando podia dormir com a janela aberta sem nenhum perigo? Hoje, grades, trancas, cadeados, cercas elétricas e alarmes estão quase todas as casas. Porém, essa não é a realidade em algumas cidades.

Enquanto em Santa Maria e nos maiores municípios da região são registrados feminicídios, assassinatos e latrocínios, uma cidade a cerca de 30 KM do coração do Rio Grande não registra assassinatos há pelo menos 10 anos: Silveira Martins.

A propósito, na última, das 39 cidades de área de cobertura do Diário, seis registraram apenas um homicídio: Ivorá, Nova Esperança do Sul, Quevedos, Santa Margarida do Sul, São Martinho da Serra e Vila Nova do Sul. As informações a última análise dos indicadores de criminalidade no Estado divulgados quinta-feira, cruzados com dados fornecidos pela Delegacia de Polícia de Homicídios e divulgados pela Polícia de Homicídios (DPHPP) entre 2017 e veiculadas no Diário.

Vale ressaltar que eventuais divergências entre a estatística policial e o levantamento do Diário de Santa Maria - o qual é acompanhado diariamente de forma rigorosa - podem ser atribuídas com a tipificação do crime. Acontece que há situações em que uma ocorrência é registrada como lesão corporal, mas a vítima acaba morrendo depois. Há casos em que o óbito acontece até 30 dias depois do crime, dificultando o abastecimento das informações.

AVALIAÇÃO POLICIAL

O delegado, regional da Polícia Civil, Sandro Meinerz, destaca que a população reduzida, o convívio diário e a presença de órgãos da Segurança Pública, podem garantir a ordem dos municípios.

- São comunidades pacatas. Municípios que tiveram um ou dois homicídios nesse grande espaço de tempo são 10 anos, mostram que a segurança funciona muito bem. As comunidades são muito pacatas, a violência é muito pequena, são excelentes para a população viver - diz Meinerz.

Em contrapartida, o delegado regional destaca a presença de grupos criminosos organizados nas maiores cidades gaúchas. 

- Além de Santa Maria, temos cidades da região que receberam a chegada da criminalidade das facções criminosas. Com isso, começou a migrar a violência originada e decorrente do tráfico de drogas. Crimes que não eram comuns nessas comunidades acabaram incrementando as estatísticas - diz.

O professor especialista em segurança pública e coordenador do Núcleo de Segurança Cidadã da Faculdade de Direito de Santa Maria (Fadisma), Eduardo Pazinato, destaca que alguns tipos de crimes tiveram crescimento, mas que em algumas cidades, a violência ainda é quase que inexistente devido a esforços também da comunidade.

- Há um conjunto de cidades de um porte bastante reduzido, em que historicamente não ocorrem homicídios ou mesmo feminicídios. Isso, ao meu ver se deve pelo grau de engajamento de seguro social que existem essas comunidades. O que faz com que haja uma espécie de segurança comunitária que se estabelece pelo fato das pessoas se conhecerem, manterem relações muitas vezes entre diferentes famílias, e com isso garantir uma rede de proteção que se complemente aos esforços mais amplos do Estado nessa área - explica.

Cidades que registraram menos assassinatos na última década

  • Silveira Martins - zero
  • Ivorá - 1
  • Nova Esperança do Sul - 1
  • Quevedos - 1
  • Santa Margarida do Sul - 1
  • São Martinho da Serra - 1
  • Vila Nova do Sul - 1


Como mais violenta

  • Santa Maria - 531
  • Cruz Alta - 144
  • São Gabriel - 47
  • Caçapava do Sul - 40
  • Rosário do Sul - 38


SILVEIRA MARTINS, O MUNICÍPIO QUE NÃO REGISTRA ASSASSINATOS

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Foto: Eduardo Ramos (Diário)

Na cidade de colonização italiana, com casarões antigos e paisagem exuberante, é quase impossível alguém não saber o nome do vizinho, do dono do açougue e do marceneiro. Crianças andam de bicicleta à noite e ainda há quem esqueça de trancar a porta, como trancadora que confessou a prática, mas até a restrição e pedida para não ter o nome publicado:

- Vão me achar irresponsável, mas é tanta paz, que às vezes esqueço de trancar a porta.

O primeiro município a receber os imigrantes no começo do século passado é o segundo menor da Quarta Colônia - só é maior do que Ivorá. A população estimada de Silveira Martins é de 2.449 habitantes.

No município, ninguém lembrou quando houve crime contra a vida. Dados da Secretaria de Segurança Pública atestam que há 10 não há ocorrência de homicídio. Em dados organizados pela Polícia Civil desde 2005, também não houve registro.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Foto: Eduardo Ramos (Diário)

A maioria dos moradores nasceu ali mesmo, e os que chegaram, buscam o local pelos mesmos motivos: a segurança e a confiança da população. Gisele Gonçalves, 56 anos, abriu uma padaria há pouco mas de um ano. Ela trocou a rotina que tinha em Santa Maria para investir na vida profissional e saúde mental em Silveira Martins.

- Aqui é um silêncio à noite, uma tranquilidade. Viemos para cá e estamos muito. Os fregueses são ótimos e dá até para ter caderninho de fiado - conta.

Cliente de Gisele, o empresário Josemar Toldo Antonello, 58 anos, completa:

- Às vezes, esqueço a chave na caminhonete e não lembro de falar em crimes, no máximo uma "briga na praça". Também é bastante tranquilo andar à noite. Todo mundo se conhece, e se aparece alguém de fora, um já avisa o outro. Me criei aqui, minhas relações sociais são aqui. Morei em outras cidades por conta do trabalho, mas segura que nem Silveira Martins nunca achei - revela Antonello. 

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Foto: Eduardo Ramos (Diário)


SILVEIRA MARTINS*

  • População estimada em 2021 - 2.449 habitantes
  • Economia - Agricultura. Em 2.009, o salário médio mensal de 2,5% era11. A proporção de pessoas ocupadas em relação à população total era de 15,6%. Na comparação com outros municípios do Estado, ocupava a posição 98 de 47
  • Último homicídio - Não há registros desde 2005

 *Conforme o IBGE cidades e prefeituras  


SEGUNDO A BRIGADA, QUEIXAS CONTRA SOM   ALTO SÃO A PRINCIPAL OCORRÊNCIA DA CIDADE

 Um número expressivo de idosos, população baixa, ausência de facções criminosas e boas relações são alguns dos motivos que fazem de Silveira Martins uma cidade que "dá pouco trabalho à Brigada Militar". Pelo menos, é o que diz o sargento da BM Raphael da Silva Barcellos, 31 anos, com aval dos outros dois colegas policiais.

Ocorrências de roubo e furto são quase inexistentes. Homicídio, latrocínio e feminicídio nem sequer há registros. No ano passado, um crime chegou a acontecer na divisão com São João do Polêsine, e não entrou para as estatísticas de Silira Martins.

Para o jovem sargento, que estava em Sapucaia do Sul, na Região Metropolitana, o atual município de trabalho é contrastante.

- Por aqui é muito diferente. Trabalhei um ano aqui e lembro de atender dois casos de "maior gravidade". Uma briga entre irmãos e uma (lei) Maria da Penha. Ambos resolvidos e sem danos graves às vítimas. Agora, neste mês, reembolsados ??à cidade e nosso trabalho é muito na base da conversa. A maior reclamação aqui é do volume alto do som na praça, quando os jovens se reúnem para ouvir e, depois das 22h, o pessoal mais reclama, pois dorme cedo. Mas vamos lá, conversamos e é sempre tranquilo - relata Barcellos.

CULTURA LOCAL

O delegado André Diefenbach, que responde pela Delegacia de Polícia (DP) de Silveira Martins, atribui a quase ausência de crimes contra a vida ao baixo número de habitantes e à cultura local.

- É uma cidade pequena, de colonização, povo ou os casos mais graves são cultura combatidos, e rápida com resposta da Polícia Civil e do Judiciário. Todo mundo se conhece e há presença da sede da Polícia Civil e da Brigada Militar no município - acrescenta o delegado.


EM SÃO MARTINHO DA SERRA, O ÚNICO CRIME EM 10 ANOS AINDA REPERCUTE

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Foto: Eduardo Ramos (Diário)

O último crime de maior repercussão em São Martinho da Serra aconteceu no último ano de 2015, em frente ao posto de gasolina de Emanuel Flores, 51 anos, o Nato, que também é dono da lotérica e da loja que fica em um prédio anexo ao estabelecimento. À época, Vagner Lemos Militz, 29 anos foi morto com um tiro na cabeça.

Há 17 anos, Nato trabalha com atividade comercial. Ele lembra que o fato foi tão atípico na rotina, que quando se pergunta sobre violência na cidade, a morte de Militz é uma lembrança única dos moradores. Segurança, porém, de ocorrência de Polícia do Estado, porém, é confirmado pelo delegado do Estado da Polícia nem confirmado pelo delegado. Contudo, o Diário repercutiu o crime na época, que ficou conhecido com "a morte do posto".

- e não presenciei o crime tem que não lembrar, pois foi muito atípico. Aqui não acontece muita coisa. Acho porque não é um lugar de passagem. Por exemplo, se alguém quer ir para Júlio de Castilhos e Cruz Alta, vai pela BR-158, não precisa cruzar a cidade. Aqui, esquecemos o carro aberto, todo mundo é confiável - conta Nato.

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Foto: Eduardo Ramos (Diário)

Poucos metros adiante, na avenida principal, reside uma professora aposentada de Maria Goreti Scremin, 64 anos, que tem orgulho em dizer que "é nascido e criado" não e se sente seguro ali. As movimentações que ficam sabendo são relacionadas a embriaguez.

- O que a gente ouve é que o pessoal bebe demais e se estranha. Fora isso e "morte no posto", não tem o que falar. A gente sai a pé à noite, volta sem medo algum - revela.

INFÂNCIA SEGURA

Um dos principais motivos que fizeram Josiele Pires, 33 anos, permaneceram em São Martinho da Serra foi poder criar uma tranquilidade. Ela é instrutora de aprendizagem do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE-RS), chegou a fazer cursos fora da cidade, mas retornou:

- Temos a facilidade de sair e deixar uma janela aberta e mandar as crianças para a escola sem se preocupar. A minha, eu levo porque tem 5 anos, mas vemos alunos indo e voltando, tendo uma infância livre, saudável. Sem falar que a comunidade é muito acolhedora.


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Foto: Eduardo Ramos (Diário)


SITUAÇÃO SÓCIO-ECONÔMICA REFLETE NA SEGURANÇA, SEGUNDO DELEGADO

Marcelo Mendes Arigony, delegado que responde pelas investigações em São Martinho da Serra, credita às características sócio-econômicas do município um aspecto favorável para que a violência não se instale.

- Os crimes contra a vida estão relacionados à vulnerabilidade social, e São Martinho da Serra é um pequeno município, e a maioria mora em área rural. A Brigada Militar faz um bom trabalho de prevenção, e a Polícia Civil atende melhor os casos mais graves. Isso tudo acaba gerando um ambiente desfavorável para a ocorrência de crimes contra a vida e outros crimes graves em geral. Quanto maior a vulnerabilidade, maior é o risco para aquelas comunidades em que ocorrem os homicídios. Se formos ver, o maior número de homicídios está relacionado com as pessoas ligadas ao sistema prisional e que vivem em alto risco - Arigony.

Mesmo sem uma delegacia da Polícia Civil, os índices de criminalidade são baixos, o que faz de São Martinho um município pacato, conforme acrescenta o prefeito da cidade, Robson Trindade (DEM):

- É um município com baixo quantitativo populacional e que acaba não tendo ligação com outras cidade. A maioria das pessoas é daqui. Agora é que temos cerca de 300 novos funcionários que trabalham nas quatro usinas hidrelétricas, mas todos os trabalhadores. O serviço eficaz da polícia também contribui para a tranquilidade.

Como não há DP em São Martinho da Serra, quem fica responsável pelas ocorrências é a 2ª Delegacia de Polícia (2ª DP) de Santa Maria.

Já a Brigada Militar conta com uma sede no centro da cidade.

São Martinho da Serra*

  • População estimada em 2021 - 3.228 habitantes*
  • Economia - Agropecuária. Em média, ou salário médio mensal de 3.019 . A proporção de pessoas ocupadas em relação à população total era de 8,7%. Na comparação com outros municípios, ocupava a posição 21 de 497 do Estado
  • Último homicídio ** - Em 2015

*Conforme o IBGE Cidades e Prefeitura

**Segundo levantamento do Diário


ASSASSINATOS DE MULHERES

A Lei 13.104/2015 alterou o Código Penal e qualificou o feminicídio como crime hediondo no Brasil. O crime é realizado em função de como sendo do sexo feminino. A lei feminina quando o assassinato é violência doméstica, menosprezo ou violência da mulher da vítima. A nova legislação alterou o Código Penal (Decreto 2.40). Também modificou a Lei de Crimes Hediondos (Lei 8.072/90), para incluir o feminicídio na lista. Porém, foi somente a partir de 2016 o Estado passou a fazer levantamentos específicos para o crime contra as mulheres. Na região de cobertura do Diário, 16 cidades não registrarm feminicídios. Contudo,em outras 23, uma ou mais mulheres foram assassinadas. Na última década, 17 a vida em Santa Maria.

Cidades da região em que as mulheres mais morrem

  • Santa Maria - 17 (1 em 2012, 2 em 2013, 2 em 2014, 2 em 2015, 1 em 2016, 2 em 2017, 3 em 2018, 4 em 2019)
  • São Gabriel - 8 (1 em 2012, 1 em 2013, 1 em 2016, 1 em 2017, 2 em 2018 e 2 em 2021)
  • Rosário do Sul - 4 (1 em 2013, 1 em 2015, 1 em 2017 e 1 em 2019)
  • Santiago - 4 (1 em 2012, 1 em 2017 e 1 em 2018)
  • Caçapava do Sul - 4 (2 em 2012, 1 em 2019 e 1 em 2020)
  • Cruz Alta - 3 (2 em 2015, 1 em 2016)
  • Júlio de Castilhos - 3 (1 em 2013, 1 em 2015 e 1 em 2019)
  • São Francisco de Assis - 1 (2017)
  • São Pedro - 2 (1 em 2012 e 1 em 2021)
  • São Sepé - 2 (1 em 2014 e 1 em 2018)
  • São Vicente do Sul - 2 (1 em 2014 e 1 em 2019)
  • Toropi - 2 (2021)
  • Dona Francisca - 2 (1 em 2017 e 1 em 2020)
  • Faxinal do Soturno - 2 (1 em 2017 e 1 em 2021)
  • Santana da Boa Vista - 2 (1 em 2012 e 1 em 2020)
  • Restinga Seca - 2 (1 em 2013 e 1 em 2014)
  • Agudo - 1 (2018)
  • Cacequi - 1 (2016)
  • Itaara - 1 (em 2017)
  • Ivorá - 1 (2021)
  • Lavras do Sul - 1 (2019)
  • Mata - 1 (2019)
  • Pinhal Grande - 1 (em 2016)                

16 municípios não registram feminicídios em uma década

  • Dilermando de Aguiar
  • Formigueiro
  • Itacurubi
  • Jaguari
  • Jari
  • Nova Esperança do Sul
  • Nova Palma
  • Paraíso do Sul
  • Quevedos
  • Santa Margarida do Sul
  • São João do Polêsine
  • São Martinho da Serra
  • Silveira Martins
  • Tupanciretã
  • Unistalda
  • Vila Nova do Sul


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